Diciembre de 2019
(c) Marcos Netto – @1marcosnetto

Todo motociclista deseja viajar e conhecer alguns lugares. Meu nome é Marcos Netto. Sou motociclista há mais de 30 anos e comigo não poderia ser diferente. Sempre tive o sonho de conhecer a Patagônia e os Andes. Apesar de já ter viajado algumas vezes para a Argentina e Chile, nunca havia tido a oportunidade de ir para aqueles lados.

Isto se deu devido a minha atividade profissional. Na condição de gestor de uma empresa de alimentos e bebidas na região metropolitana de Porto Alegre, nosso pico de negócios e trabalho ocorre nos meses de verão, justamente no mesmo período em que as viagens de moto para a Patagônia e sul da Argentina são mais favoráveis devido ao clima. Nesta época é difícil ausentar-me do trabalho por cerca de 3 semanas, tempo mínimo necessário para fazer uma boa viagem de moto e aproveitar bem a região.

Para chegar até lá são necessários vários dias para ir e vários dias para retornar, mesmo pilotando de forma muito rápida. E correr de moto não é o meu estilo. Gosto muito mais de pilotar de forma calma e tranquila, aproveitando para fotografar as paisagens e também o que trajeto oferece de melhor em termos de cultura e gastronomia.

Porém, no início de 2019 durante uma conversa com um casal de amigos moradores de Bahia Blanca no sul da Argentina, eles comentaram que um familiar deles, piloto de motocicletas e que já havia inclusive competido no Rallye Dakkar em suas edições na America do Sul, havia iniciado uma operação de locação de motos em Villa La Angostura, cidade vizinha a San Carlos de Bariloche na região dos Sete Lagos na Patagônia Argentina. Na hora eu não dei muita atenção; mas depois eu comecei a pensar se não seria a oportunidade que eu tanto esperava para pilotar pelos Andes…

E a oportunidade chegou em dezembro do mesmo ano! Para minha surpresa descobri que a Aerolineas Argentinas tinha uma rota entre Porto Alegre e Bariloche com um voo que parte da capital gaúcha as 8 da manhã; e com apenas uma conexão de menos de duas horas em Buenos Aires sem nem precisar trocar de aeroporto, chega em Bariloche as 14:30 horas. E com mais um pequeno trecho de van eu já estaria em Villa La Angostura, local de partida dos tours e sede da Moto Rent Patagonia, empresa que faz a locação das motos. E assim eu fui eu, saindo de Porto Alegre num domingo pela manhã e chegando em Bariloche logo no início da tarde conforme o programado.

O trajeto de Bariloche para La Angostura é feito numa van cujo bilhete pode ser adquirido pela Internet ou num guichê no próprio aeroporto. Os 80 quilômetros que separam as duas cidades são percorridos em aproximadamente 1 hora, atravessando paisagens lindíssimas entre montanhas e lagos. Recomenda-se reservar este bilhete antecipadamente, tanto na ida quanto na volta.

Acho chegar em Villa La Angostura fui diretamente para o hotel sugerido pela Moto Rent Patagonia (MRP), que fica muito próximo da estação rodoviária e na mesma rua onde a empresa está localizada. Após fazer o check in, fui diretamente para a loja da MRP para uma reunião com o proprietário e piloto Juan Suarez Zapata, para receber as informações e briefing sobre o tour que eu iniciaria no dia seguinte.

Suarez primeiramente me falou sobre a Moto Rent Patagonia. A empresa foi fundada por ele motociclista há mais de 25 anos, logo após a última edição do Rallye Dakkar na America do Sul quando ele havia competido pela Equipe Kawasaki. Na época Suarez percebeu que havia um grande interesse em fazer moto turismo pela região principalmente por Europeus, mas que poucos conseguiam trazer suas motos para a Argentina devido aos custos de transporte e a burocracia alfandegaria. Assim, percebendo um nicho em aberto, ele fundou a empresa que faz locação de motos durante o verão e no período de inverno aluga esquis e snowboards para os turistas.

Juan (a esta altura eu já o chamava pelo primeiro nome) comentou que a temporada de motociclismo na Patagônia vai de outubro a maio. Apesar de ser possível pilotar no inverno, as constantes nevascas e o frio extremo desaconselham os passeios de moto pela região de junho a setembro. Contudo mesmo durante o verão a região conhecida pela neve não decepciona em sua beleza, pois o verde das florestas e a coloração das plantas nativas fazem a moldura perfeita para os picos nevados dos vulcões que existem nesse local.

A MRP coloca a disposição de seus clientes uma boa frota de motos, com modelos que vão desde a pequena Yamaha XTZ250, a conhecida “Tenerezinha”, até modelos mais robustos para off road como a Kawasaki KLR650. Mesmo sendo piloto de BMW R1200GS há quase 10 anos, minha escolha foi por uma Tenere 250. Os motivos principais foram dois: primeiro, eu nunca havia pilotado no ripio (cascalho) da Patagônia. Segundo, caso eu “comprasse terreno nos Andes” (caisse um tombo), queria ter certeza de que eu seria capaz de levantar a moto sozinho, pois estaria pilotando “solito no más” por praticamente todo o trajeto.

Não só não cai qualquer tombo como também desfrutei de uma economia bárbara com a Yamaha XTX250. A moto não decepcionou em momento algum com força e potência suficientes para rodar tanto no ripio quanto no asfalto; sem falar que era uma delícia ao final do dia encher o tanque de combustível e não gastar quase nada, pois além de muito econômica, a gasolina na Argentina é muito mais barata que no Brasil!

Juan me apresentou o roteiro do tour que eu iria fazer. Ele denominou o trajeto de “Doble Cruce de Los Andes”. O nome é uma referência as duas passagens de fronteira que são feitas durante a viagem: uma entre Argentina e Chile na cidade de Icalma, e outra do Chile para a Argentina em Lanin. (Existem cerca de 18 passagens entre os dois países na região…) O tour é dividido em etapas que compreendem aproximadamente 200 quilômetros por dia. Pode parecer pouco; mas é perfeito para quem gosta de pilotar apreciando a paisagem e por estradas de chão batido. Ao final de cada dia eu chegaria em uma determinada cidade onde já estaria reservado um hotel ou pousada para o pernoite.

Junto com o aluguel da motocicleta que me foi entregue com o tanque cheio, eu recebi um pequeno kit com ferramentas, lubrificante para corrente e uma camara de ar de reserva. Juan solicitou que ao final de cada dia a corrente fosse lubrificada e nada mais. A moto também tinha pequenos alforges e top case da marca Givi e junto com a locação eu recebi o capacete, obrigatório para todos os motociclistas na Argentina e Chile. A Moto Rent Patagonia também providencia toda a documentação para entrar e sair da Argentina com o veículo de aluguel, o que foi um baita conforto. Ao chegar nos “pasos de frontera” entre os dois países, bastou apenas apresentar o passaporte e os documentos fornecidos pela MRP e a liberação foi feita rapidamente.

Juan ofereceu-me como cortesia um GPS para colocar na moto. Eu educadamente agradeci e perguntei se ele não tinha uma mapa impresso, pois eu gostaria de viajar “como homem de verdade” (risos). Ele então me entregou duas folhas de papel A4 impressas a partir do Google Maps onde eu tracei uma linha com o trajeto que faria. Pilotei como “motociclista de verdade” e também consegui me perder da mesma forma… (risos).

Devidamente brifado e preparado , aproveitei o restante do domingo para conhecer a cidade de Villa La Angostura. O local é um conhecido destino turístico do estado de Neuquén na Patagônia Argentina. A cidade é parte da região dos Sete Lagos, um roteiro turístico natural espetacular tanto no inverno quanto no verão. A região possui uma cadeia de montanhas e vulcões que são entrecortados por lagos e rios de águas límpidas e geladas. O destino é muito procurado por turistas argentinos no verão e por estrangeiros no inverno; brasileiros em sua maioria que acorrem ao local em busca do turismo do frio e da neve para os esportes de inverno. La Angostura tem muitas lojas de artesanato e restaurantes com comidas típicas da região. Destaque para a famosa “parrilla” que é o churrasco no estilo Argentino, regada a excelentes cervejas artesanais e aos vinhos Malbec produzidos na vizinha região de Mendoza.

Mas vamos ao que importa: El Doble Cruce de los Andes!

 

Primeiro Dia.

A partida foi logo de manhã “cedo”: 10 horas. Os horários na Argentina, especialmente no verão, são muito mais “elásticos”. O povo sai as ruas mais tarde e as lojas e restaurantes também tem horários esticados. É comum ver pessoas almoçando em alguns locais as 16 ou 17 horas. Neste período a luminosidade do sol também vai até as 21 horas. Então para que a pressa?

Saí rumo norte em direção a Villa Traful pela conhecida Ruta 40. Os primeiros quilômetros foram em asfalto por entre lagos e montanhas incríveis. Parava a todo momento para fotografar as águas cristalinas com montanhas nevadas ao fundo. Mas logo em seguida veio a primeira experiência de pilotagem no ripio, na estrada que passa em frente ao Lago Traful. O trajeto percorre praticamente toda a extensão do lago, indo até a divisa do estado de Neuquen com Rio Negro. A região é ocupada por grandes propriedades e por eventuais casas de veraneio por dentre florestas exuberantes. A segunda parte do percurso do dia me levaria de volta a Ruta 40 sempre pelo ripio. Mas desta vez o caminho passou por uma região de montanhas de arenito quase sem vegetação, subindo por uma estrada até chegar na montanha conhecida como Paso de Cordoba dentro de um parque nacional. A região parece um deserto lunar com uma beleza incrível!

Neste ponto eu já comecei a entender porque o ripio é tão bom de pilotar mas ao mesmo tempo pode ser muito traiçoeiro. As estradas de ripio na Argentina são muito boas. Como chove pouco nessa época do ano, não há muitos buracos na estrada. As máquinas de terraplenagem das prefeituras passam por lá e tudo fica muito lisinho; quase perfeito. Então o piloto de moto sente aquela confiança e aquela vontade de acelerar. Afinal, não tem buracos, não é? Tudo vai bem até o momento em que o piso firme se transforma em cascalho solto e aí a motocicleta começa a derrapar. Uma derrapagem no ripio a uma velocidade de 60 km/h pode ser controlada. Mas acima disso é um perigo só. Eu diria que se o motociclista estiver a mais de 80 km/h é praticamente impossível segurar uma derrapagem e o tombo é certo! Eu penso que o grande desafio de pilotar nesse terreno é controlar a vontade de “enrolar o cabo” (acelerar forte). E foi o que fiz, pois a última coisa que eu queria era levar um tombo no “meio do nada” na Patagônia…

Como eu estava fazendo um “passeio de verdade”, sem levar GPS nem rastreador por satélite e o sinal de celular era inexistente na maioria do tempo, combinei com o pessoal da MRP que eu faria contato todos os dias ao final da tarde após fazer o check in no hotel ou pousada. Caso eu não fizesse isso conforme combinado, eles saberiam que eu havia tido algum problema naquele trecho programado e mandariam a equipe de apoio a minha procura. E graças a Deus isso não aconteceu.

O final do dia foi na cidade de San Martin de Los Andes; uma belíssima e charmosa estação de veraneio e de esportes de inverno. O hotel era ótimo e localizado bem no centro da cidade, o que possibilitou fazer uma boa caminhada para conhecer o local e apreciar um belo assado de tiras (costelas) ao estilo argentino, regado a um bom vinho tinto.

 

Segundo Dia.

Devidamente abastecido e sem gastar muito em combustível, parti novamente rumo norte pela Ruta 40 em direção a Junin de Los Andes. Aqui a paisagem novamente mudou. Desta vez foram longos trechos de estrada de asfalto, praticamente desertas. Longas retas com praticamente nada ao redor. Exceto por alguns rios e fazendas de gado, não havia nada. Porém após Junin de Los Andes, o trajeto indicado era pela Ruta 23 que estava praticamente toda em obras. Todo o trajeto sobre cascalho e chão batido. E para aumentar a emoção, em alguns trechos haviam obras com um grande volume de tráfego de caminhões pesados. “Una polvadera de los infiernos” ou uma poeira infernal como dizem eles, cobriu-me em quase todo o trajeto até chegar em Aluminé onde parei para almoçar. Tive sorte do povoado possuir um pequeno restaurante a beira da estrada, onde os clientes olharam com muita curiosidade aquele motociclista empoeirado pedir “el prato del dia”.

Depois de um bifão a milanesa com batatas fritas, abasteci a moto e segui em diante conforme meu mapa apontava. Novamente o trajeto foi 100% em estradas de ripio; mas desta vez segui por uma estrada sem movimento em direção ao Lago Pulmari. Novamente devo ter pilotado por mais de 100 km por uma estrada onde não havia absolutamente ninguém. Nem um outro veículo passando por mim indo ou vindo. Eventualmente uma ou outra casa de fazenda; fechada e com um ar de abandono. Isso continuou assim até que eu chegasse no Lago Ñorquincó e depois no Lago Moquehue, onde haviam algumas casas de veraneio; mas com pouquíssimo movimento. E assim segui pelo rípio entre montanhas até chegar numa cidadezinha chamada Villa Pehuenia.

Ali também fiquei absolutamente surpreso com o visual e com a paisagem. A cidade é muito pequena. Para chegar lá só em estradas de ripio pois não há ligação asfáltica com o resto da região. Villa Pehuenia fica as margens do Lago Aluminé e os hotéis numa península situada no lago. Minha hospedagem foi realizada num hotel muito peculiar e confortável, cuja construção em toras de madeira era uma atração a parte, com uma vista estupenda do lago. Mas como era o dia de folga dos funcionários, o restaurante do hotel estava fechado. Acabei encomendando um prato delicioso de massas de um restaurante próximo, que foi devidamente degustado com uma boa garrafa de vinho tinto produzido na região.

 

Terceiro Dia.

Após um belíssimo café da manhã, deixei o hotel em Villa Pehuenia e parti em direção ao Chile, pois estava muito próximo da fronteira conhecida como Paso de Icalma. Apesar do verão, nesse dia amanheceu muito frio e fui obrigado a colocar o único moleton mais grosso que havia levado. A passagem pela fronteira é muito simples todavia um tanto burocrática. Primeiro é necessário fazer os trâmites de imigração e alfândega do lado argentino. Tudo foi facilitado devido a perfeita documentação fornecida pela Moto Rent Patagonia em relação a motocicleta. Bastou apresentar o cartão de propriedade da moto, o contrato de locação, a CNH brasileira e o passaporte e pronto!

Dica: apesar de ser possível viajar com Carteira de Identidade (RG) pelo Mercosul, o passaporte facilita as coisas. Até mesmo porque o Chile não pertence ao Mercosul… Outra dica: Sempre que apresentar-se para as “autoridades”, repita sempre: “Buenos dias, por favor, si señor, muchas gracias, hasta luego!” sempre que possível. Isso facilita uma barbaridade para acelerar as coisas; podem acreditar!

Depois de cumprir a burocracia no lado Argentino, roda-se cerca de um quilômetro para repetir o procedimento do lado Chileno, onde o posto de fronteira é bem melhor estruturado e organizado.

Logo em seguida fiz uma parada em Icalma. Comprei água, biscoitos e aproveitei para fazer câmbio de moeda pois apesar de estar pagando quase tudo com cartão de crédito, sempre é bom tem algum troco na moeda local para alguma eventualidade. Meu destino previsto era seguir até a região de Lonquimay passando por dentro de florestas e parques nacionais no Chile, para após uma grande volta, terminar o dia em Melipeuco. Tudo correu bem até perto do meio dia. Porém, depois de um longo trajeto pela R-955 quase chegando em Punta Negra fui informado que haviam “protestas” na região e que manifestantes haviam interrompido a rodovia. Ninguém passava por lá e não havia previsão de liberação do caminho.

Eu tinha duas opções: aguardar a liberação ou fazer o caminho de volta e tentar achar outra maneira de chegar em Melipeuco. Optei pela segunda alternativa e fiz todo o trajeto (cerca de 100km) para voltar a Icalma.

Neste ponto, o meu desejo de fazer um passeio “raiz” tornou-se realidade. Como eu havia dito, sem usar GPS eu me perdi “como homem de verdade”. (risos). Como não pretendia retornar por aquele caminho, não prestei muita atenção no trajeto durante a ida. Quando tentei retornar para Icalma devo ter deixado de entrar em alguma estrada e segui pelo caminho errado. Como as estradas não são sinalizadas, eu não percebi de imediato o engano. Só depois de uns 30 minutos é que me dei conta do erro. Aí foi outra aventura achar o caminho de volta, pois não havia ninguém por perto para perguntar o caminho de volta. Até que depois de rodar alguns minutos no meio das montanhas encontrei um agricultor que só sabia me dizer: “Usted estas muy lejos” (você está muito longe). Bem ele apontou a direção sul e disse que era por ali. Depois de rodar mais alguns minutos, consegui achar o caminho de volta para Icalma.

Nessa altura do dia eu já não poderia errar mais porquê senão não chegaria a Melipeuco para o pernoite. Escolhi o caminho que passa por dentro da Reserva Nacional da China Muerta e fui em frente. Minha única preocupação era o combustível, pois já havia rodado uns 200 km nesse dia e apesar de ter sido informado que a XTZ250 poderia rodar 400 km com um tanque de combustível, eu não queria testar se isso era possível. E para minha falta de sorte, não havia combustível em Icalma…

O trajeto passando pela China Muerta é lindíssimo, porém muito perigoso. De Icalma até Melipeuco é uma descida de serra no ripio. Para ajudar, começou a chover bem forte. Minha sorte foi que eu percebi que isso iria acontecer e um pouco antes coloquei a proteção de chuva da roupa de pilotar que havia levado. Foi o que me salvou. Choveu muito e esfriou bastante. Caso eu não estivesse preparado poderia ter passado muito frio e/ou ficado resfriado. Nada agradável durante uma viagem dessas.

Ao final do dia cheguei em Melipeuco no Chile. A cidade fica ao sopé do Vulcão Llaima e tem algumas partes cobertas por restos de uma das erupções vulcânicas do passado. O vulcão com seu pico nevado são visíveis em praticamente qualquer lugar da cidade. Mais uma vez o pessoal da MRP foi muito feliz em escolher o local para o pernoite, que foi realizado numa pousada fora da cidade muito próxima do Salto Truful-Truful, uma cachoeira exuberante. Detalhe: a pousada é em formato de domo geodésico (quem não conhece, basta dar uma olhada no Google) e é atendida pelos proprietários que são guias de turismo de aventura. Gente muito legal que adora conversar! Como a pousada não oferecia jantar, aproveitei para conhecer o centro da cidade e degustar um dos pratos típicos da região, acompanhado por uma excelente cerveja artesanal produzida por ali. Fim do dia que apesar dos percalços foi perfeito!

 

Quarto Dia.

Parti pela manhã cedo de Melipeuco rumo a Pucon. Confome planejamento da MRP, em vez de seguir por rodovias asfaltadas, eu faria a maior parte do trajeto por estradas vicinais contornando o Lago Colichio, Lago Carburgua e depois entraria na Reserva Nacional de Villa Rica e na Reserva Nacional de Hualalafquen na Araucania, Chile, para somente depois seguir para Pucon. Durante o briefing da viagem na MRP, Juan me avisou que este seria um dos trajetos mais lindos do passeio; mas que a estrutura na maior parte do tempo era inexistente. Resolvi então ainda em Melipeuco parar num mercadinho comprar um sanduíche feito com pão típico local, queijo e presunto.

Logo ao sair de Melipeuco eu deparei-me com uma das construções mais bonitas da viagem: uma Igreja erguida em madeira e pintada em tons de rosa e branco, na cidade de Villa Garcia. A Igreja está em frente a uma praça muito bonita, entretanto mal conservada. Para minha sorte, duas senhoras que cuidam da Igreja estavam no local e ofereceram-me para conhecer o seu interior, que era simples mais muito bonito. Um viajante apressado ou desatento não teria percebido tal edificação.

Lembram-se do sanduíche? Foi uma ótima ideia. Aquele ditado: “Quanto melhor a vista, pior o caminho para chegar lá.” foi exatamente o que aconteceu. As estradas que levam aos parques nacionais naquela região do Chile são bastante precárias e praticamente sem nenhuma estrutura para atender o viajante; o que para mim não foi problema porque eu estava muito bem equipado com um sanduíche e uma garrafa de água (risos), além de umas batatinhas chips. Meu almoço nesse dia foi a beira do Lago Colichio numa área de camping muito bem conservada mas completamente vazia nesta época do ano.

O trajeto por dentro dos parques nacionais é muito bonito. Apenas as estradas são bastante empoeiradas, o que não foi problema algum. Ao aproximar-se de Pucon as estradas vão melhorando até tornarem-se um asfalto perfeito! O trajeto entre Curarrehue e Pucon é feito por entre montanhas e rios e vai atravessando pequenos vilarejos muito bonitos. Vale a pena ser feito com calma para apreciar o visual.

Ao chegar em Pucon na metade da tarde, mais uma vez constatei que o pessoal da MRP soube escolher com precisão um ótimo hotel, que além de muito confortável possuía uma ótima localização! Ao redor do hotel havia vários restaurantes, bares, cafeterias e cervejarias artesanais, sem falar num shopping center a poucas quadras dali. Decidi que completaria o dia apenas relaxando e o jantar seria com um maravilhoso hambúrguer tradicional da região, regado a uma excelente cerveja preta feita no próprio local.

Aqui cabe outra nota a respeito do hotel em Pucon. O quarto escolhido tinha uma vista incrível do Vulcão Villarrica. Amanhecer com um visual espetacular de uma obra de arte da natureza não tem preço. Palmas mais uma vez para MRP!

 

Quinto Dia.

Neste dia que era para ser o penúltimo houve uma mudança de planos. No planejamento original o trajeto seria até Puerto Fuy para um pernoite e no dia seguinte atravessar o Lago Pirihueico com a moto num ferry boat. Porém, isto me deixaria “vulnerável” a atrasos para o voo de volta ao Brasil em caso de qualquer contratempo no último dia, que poderia ser desde uma pane mecânica, uma mudança brusca na temperatura ou até mesmo uma eventual interrupção de rodovias por protestos no Chile. Conversei com o pessoal da MRP e decidimos que seria mais tranquilo voltar para a Argentina através do Paso de Mamuil Malal.

E assim o fizemos seguindo a partir de Pucon para Correntoso e depois atravessando um bosque de araucárias fantástico antes de chegar à fronteira com a Argentina. Mais uma vez os trâmites de imigração e aduana foram muito rápidos, tanto no lado Chileno como no lado argentino. Havia um ônibus de excursão com muitos estudantes no local; mas os veículos e viajantes que estavam sozinhos tinham prioridade na passagem.

Um detalhe muito interessante deste “paso” entre Chile e Argentina é a proximidade com o Vulcão Lanin que está praticamente ao lado do posto de fronteira, oferecendo uma vista de tirar o fôlego de quem ali passa para realizar os trâmites burocráticos de fronteira. Aliás, a vista do Lanin acompanha o viajante em um longo trecho de viagem, desde a fronteira até passar por Junin de Los Antes na Ruta 40.

Assim, depois de atravessar a fronteira, segui para Junin de Los Andes e novamente por San Martin de Los Andes, até retornar ao final do dia para Villa la Angostura onde ficaria por mais um dia.

 

Sexto dia:

O pessoal da MRP ficou muito satisfeito em saber que tudo havia transcorrido bem com o passeio e entenderam perfeitamente a minha preocupação a respeito do retorno para La Angostura e a partida no voo em Bariloche. Após esse episódio eles passaram a sugerir para os moto-aventureiros que retornem para o ponto de partida com no mínimo um dia de antecedência da data do voo em Bariloche, para evitar quaisquer contratempos que possam ocasionar a perda do horário do voo.

Como eu fique com um dia livre eles ofereceram-me como cortesia uma diária na locação da Tenere 250. Eu gentilmente agradeci e declinei a oferta. Mas eles foram insistentes e sugeriram que eu não poderia deixar de conhecer mais três lugares ali próximos: Puerto Angostura, Puerto Manzano e Cerro Bayo.

Os dois primeiros estão localizados na Bahia San Patricio no Lago Nahuel Huapi, praticamente ao lado de Villa la Angostura. São bairros muito elegantes com casas de luxo e uma visual de tirar o fôlego!

Já o Cerro Bayo é uma montanha muito conhecida pelos praticantes de esportes de inverno, e que no verão oferece trilhas muito bonitas dentro da floresta. E numa dessas trilhas está a Cascata do Rio Bonito, uma enorme queda d´água coberta pela floresta, que pode ser vista a partir de um mirante muito próximo da estrada. Vale a pena a visita!

Ao final do dia fiz a entrega da Tenere 250 para a Moto Rent Patagonia. Eles revisaram a moto e constatado que estava tudo ok ela já foi para a revisão e ducha, para estar disponível no dia seguinte para outro aventureiro.

E eu aproveitei meu último dia em Villa La Angostura para fazer algumas compras, em especial vinhos e alguns perfumes, aproveitando os preços ótimos e o câmbio muito favorável para os brasileiros. As compras foram seguidas de um delicioso “Ojo de Bife”, o nosso entrecote, assado no estilo argentino, acompanhado por um ótimo “tinto mendocino” (vinho de Mendoza).

Nesse momento eu aproveitei também para fazer as contas e uma avaliação do meu passeio de moto pelos Andes. Minhas observações:

– Alugar uma moto lá na Patagônia em vez de ir pilotando minha própria moto teve muitas vantagens. Primeiro, economia de dinheiro. O que eu gastaria em combustível, pedágio, hospedagem, alimentação e manutenção da moto para ir e voltar até lá, foi amplamente compensando pelo custo acessível da passagem aérea e da locação. E de quebra a Aerolineas Argentinas parcela o bilhete aéreo em 12x no cartão, sem juros…

– Economia de tempo. Gastar quatro dias para ir, mais quatro dias para voltar, e o tempo de 7 dias para passear, se somados excederiam meu tempo disponível. Assim, eu aproveitei tudo e no final das contas só fiquei fora cinco dias úteis. Este é um tipo de passeio ideal para quem deseja curtir muito mas tem pouco tempo disponível.

– Muito menos desgastante fisicamente, pois em apenas algumas horas eu já estava lá no destino final (que é o que realmente me interessava aproveitar) prontinho e cheio de vontade de passear.

– A moto era nova, perfeita, revisada e com estrutura de apoio. Caso houvesse algum problema, o pessoal da Moto Rent Patagonia iria consertar ou substituir a moto. )Também fiquei sabendo que quando o pessoal viaja em pequenos grupos eles colocam guia e veículo de apoio a disposição sem custos).

– Todos os tramites de documentação e seguro cobertos durante o passeio, o que facilitou muito principalmente na burocracia de alfândega e aduana. Não houve perda de tempo.

– Segurança. Todo o roteiro foi desenvolvido por motociclistas para motociclistas. Não corri o risco de me meter numa roubada. ( Exceto quando “me perdi com um homem deve ser perder; sem GPS e sem perguntar…” )(risos).

– Custos extremamente acessíveis. Chegar ao final de um dia de pilotagem e ao encher o tanque por apenas R$ 25,00 e tomar uma garrafa de vinho Reserva por R$ 22,00 é realmente imbatível.

 

Sétimo Dia.

Após o café da manhã no hotel, despedi-me do pessoal e fui caminhando tranquilamente até a estação rodoviária onde a van levou-me para o aeroporto de San Carlos de Bariloche. O voo partiu por volta de 14 horas e após uma rápida conexão no aeroporto de Ezeiza em Buenos Aires, segui em outro voo para Porto Alegre onde cheguei por volta de 19 horas.

Fim de um ótimo dia e encerramento de um passeio de moto maravilhoso por uma das regiões mais bonitas do mundo.

Já estou planejando retornar para lá em breve, pois existem muito mais locais a serem descobertos ,e como os próprios argentinos dizem, “disfrutados con mucha gana”.

Hasta luego! Até breve!

Marcos Netto